Cerca de 70 índios Xakriabá, de São João das Missões, no
Norte de Minas, ocupam, desde a manhã de hoje (26), a sede do Distrito
Sanitário Especial Indígena (Dsei), em Governador Valadares, no Vale do Rio
Doce. Os 26 funcionários do órgão são mantidos reféns e só serão liberados após
a saída da atual chefe do distrito, Elizabeth Cristina Gosling Stehling,
segundo o cacique Santo Caetano Barbosa. Os índios reclamam da falta de exames,
remédios, água e saneamento básico na aldeia.
Os índios são da aldeia Morro Vermelho e percorreram 783 kms
até Valadares, onde chegaram por volta das 9h30. Os portões foram fechados e os
funcionários impedidos de sair, com exceção de três que passaram mal e duas
mulheres que estão amamentando. A Polícia Militar e a Federal ocuparam as
imediações do órgão, que fica na Avenida Piracicaba, Ilha dos Araújos. Às 13
horas, ainda sem almoço, os funcionários reclamavam de fome.
De acordo com o Barbosa, desde a entrada de Stehling, há um
ano, a saúde dos Xakriabás “que já andava ruim, piorou”. “Tentamos o diálogo
muitas vezes, mas não fomos recebidos e nem ouvidos. Agora queremos a saída
dela”. Entre as reivindicações está a falta de remédios e exames. O cacique
reclama que, apesar de ser formada por cerca de dez mil indígenas, a comunidade
Xakriabá teria direito a apenas 20 ultrassons por mês. “Temos pessoas na fila
de exames há um ano, seis meses. Muitas outras já morreram por falta de
atendimento. Falta médico, medicamento, falta tudo”, denuncia. Segundo ele, as
comunidades Xakriabás estão fazendo “vaquinha” para comprar canos e assim
garantir o abastecimento de água que em muitas famílias só chega por meio dos
caminhões pipa. A falta de saneamento básico é outro problema. “O esgoto adoece
as crianças”.
Barbosa reclama também que a atual administração do Dsei não
estaria respeitando a organização interna das aldeias, garantida pela
Constituição Federal. Uma das irregularidades seria o envio de funcionários
para trabalhos internos nas aldeias sem aviso prévio ou a aceitação dos
caciques e lideranças. “São pessoas que não sabem trabalhar ou respeitam os
índios. A saúde indígena virou cargo político, em todas as esferas”, reclama.
Ainda conforme o cacique, os funcionários não são reféns –
ele calcula 50 pessoas. Todos estariam sendo mantidos em seus setores para que
cuidem dos seus equipamentos e materiais de trabalho. “Não queremos que a
imagem do índio Xakriabá seja denegrida, que falem que quebramos alguma coisa
porque não vamos fazer isso. Nossa manifestação é pacífica, mas só sairemos
daqui depois que nossas reivindicações forem encaminhadas”, diz.
Uma reunião estava marcada para o início da tarde entre
representantes do Ministério Público Federal (MPF), Polícia Federal (PF), Dsei
e lideranças indígenas. O chefe do Dsei não foi encontrado para falar sobre o
assunto. Segundo funcionários, desde que os rumores da ocupação surgiram, há 15
dias, ela vem despachando de outro endereço.
A funcionária Fátima das Dores Silva, que trabalha com a
saúde indígena há 26 anos, estão entre os reféns. Ela conta que esta é a quarta
vez, só em Valadares, que passa pela mesma situação. Da última vez, em 2007,
ficou de 9 às 2 horas da madrugada sem poder voltar para casa - índios de
várias etnias ocuparam a sede do órgão para impedir a sua transferência para
Belo Horizonte. “O jeito é manter o controle, aguardar com paciência”, disse,
pela grade do Dsei.