quarta-feira, 24 de julho de 2013

Novo Código de Processo Civil ampliou prazo para devedor de pensão alimentícia pagar o débito e abranda as punições.


Aprovado em comissão especial da Câmara dos Deputados na última semana, o novo Código de Processo Civil dá mais oportunidades para o devedor de pensão alimentícia pagar o débito e abranda as punições.
Para entrar em vigor, o novo código ainda precisa ser aprovado no plenário da Câmara e voltar para análise do Senado. Os senadores já aprovaram, mas como o texto foi modificado na Câmara, terão de analisá-lo novamente.
A nova lei mantém a regra de que a falta de pagamento de pensão é o único fator cível que pode levar uma pessoa à prisão (os demais são criminais). O prazo de prisão também permanece em no mínimo um mês e no máximo três meses.
Atualmente, o devedor fica preso em delegacias ou presídios, às vezes junto com outros detentos. O projeto em tramitação prevê prisão em cela separada de presos que cometeram crimes. Nos locais onde não for possível a separação, o novo código estabelece que o juiz terá de conceder prisão domiciliar.

A legislação em vigor prevê que, no caso de não pagamento de pensão, o devedor terá três dias para quitar o valor. Se não pagar, o juiz pode decretar prisão. O texto aprovado na comissão da Câmara aumenta de três para dez dias o prazo para pagamento

OUTROS PONTOS DO PROJETO DO
NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

ORDEM CRONOLÓGICA
Pela nova regra, os juízes terão que julgar processos pela ordem de chegada. Isso evitará que ações novas sejam julgadas antes de antigas.

CONCILIAÇÃO
O código prevê que a tentativa de conciliação deve ocorrer no início de todas as ações cíveis.

RECURSOS
O texto prevê multa para as partes quando o juiz constatar que o recurso é utilizado como forma de protelar o fim da ação. Retira a possibilidade de agravo de instrumento para decisões intermediárias (sobre provas, perícias, etc). Acaba com o embargo infringente, no caso de decisão não unânime, mas prevê que o caso seja reavaliado por outra composição.

AÇÕES REPETITIVAS
Prevê que uma mesma decisão seja aplicada a várias ações individuais que tratam do mesmo tema. Entre as ações que podem ser beneficiadas estão processos contra planos de saúde e empresas de telefonia. Nesses casos, todas as ações de primeira instância serão paralisadas até que a segunda instância tome uma decisão.

AÇÕES COLETIVAS
Outra novidade é que ações individuais poderão ser convertidas em ações coletivas. Antes, as partes serão consultadas sobre se aceitam a conversão do processo.

Se o devedor não fizer o pagamento, o juiz mandará protestar a dívida, o que levará a restrições de obtenção de crédito. Além disso, poderá decretar prisão de até três meses no regime semiaberto (no qual o detido pode deixar a prisão de dia, para trabalhar, e voltar à noite para dormir). Em caso de nova situação de inadimplência, o devedor irá à regime fechado.

Além das novas regras de prisão, o projeto do Código de Processo Civil pretende dar celeridade a ações civis, reduzindo a possibilidade de recursos, obrigando o julgamento de ações em ordem cronológica e determinando que ações sobre o mesmo tema sejam paralisadas até julgamento por instância superior.

Presidente da comissão especial que aprovou o texto, o deputado Fábio Trad (PMDB-ES) esclareceu que o objetivo das novas regras sobre a pensão foi "dar oportunidade" para o preso pagar. "A ideia é permitir que o preso trabalhe para pagar a dívida", destacou.

Ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Luís Felipe Salomão destacou que é uma "tendência mundial" aplicar cada vez menos a prisão e mais as outras formas de garantir o pagamento da dívida. Ele frisou que o novo código segue o entendimento já firmado pelo STJ de que a prisão deve ser exceção.

"O que se quer é obter o dinheiro para o credor da pensão. Às vezes, a prisão é quase que uma vingança. É um instrumento de pressão, mas o que tem funcionado cada vez mais efetivamente é a penhora. Cada vez mais se constroem formas de cobrar, como saque do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), participação nos lucros, hora extra."

Para o presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Marcus Vinícius Furtado, as punições foram abrandadas, mas o novo código não tira a efetividade do instrumento da prisão para garantir os pagamentos. Furtado integrou comissão de juristas que discutiu o texto no Senado antes da análise pelos parlamentares.

"Vivemos num país em que o sistema penitenciário está superlotado e deverá ser direcionado para os criminosos de alta periculosidade. No caso do não pagamento de pensão, só o fato de determinar a prisão, faz o sujeito pagar imediatamente quando tem condições, seja no regime aberto, semiaberto ou fechado. O instrumento [decretação da prisão] já é a efetivo", diz o presidente da OAB.

Segundo o desembargador Lineu Peinado, presidente da comissão de acompanhamento da reforma do Código de Processo Civil na Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), atualmente não há regime prisional definido e, por isso, há casos de detidos em delegacias e outros em presídios. Para ele, cerca de 90% dos casos de prisão por pensão não deveriam ocorrer.

"Hoje, 10% dos casos de prisão por alimentos deveriam ser tratados como prisão. Outros 90% são de pessoas que efetivamente não podem pagar a dívida", afirmou.

Outros temas
Em relação a outros temas tratados no Código de Processo Civil, o presidente da OAB, Marcus Vinícius Furtado, aponta uma lacuna em relação a ações repetitivas. O novo código prevê que, no caso de várias ações individuais que tratam do mesmo tema, os processos devem ser paralisados até que a segunda instância tome uma decisão.

Marcus Vinícius defende uma regra objetiva sobre ações repetitivas. Para ele, somente casos em que há mais de 1 milhão de processos sobre o mesmo tema devem ser paralisados à espera de decisão de instância superior.

"Tendo critérios objetivos evitaria suscitar multiplicação de demandas repetitivas e, com isso, paralisar processos e resultar na impossibilidade de julgamento. O incidente [de ações repetitivas] deve ser usado somente em causas que forem justificáveis, para que o que foi feito para agilizar, não dificulte ou retarde a prestação da Justiça."

O desembargador Lineu Peinado, da AMB, diz que o instrumento da conciliação, embora "doutrinariamente perfeito", pode ser impossível de ser praticado por conta da falta de estrutura.

"A conciliação está se mostrando equivocada. Não temos estrutura para fazer conciliação em todos os casos e nem vamos ter. Vamos precisar treinar e capacitar conciliadores, o que demanda um a dois anos. É doutrinariamente perfeito, mas na prática não será possível pelo número de processos que temos."

Relator do texto na Câmara, o deputado Paulo Teixeira (PT-SP) afirma que o novo código pretende acelerar julgamentos e garantir decisões mais justas.

"Temos três pontos importantes. O primeiro instrumento forte disso é a conciliação no início do processo. Em segundo lugar, o incidente de demandas repetitivas para resolver ações iguais [...] e a conversão de ações individuais em coletivas. A terceira coisa é que diminuíram  os recursos, e os juízes terão que seguir a jurisprudência."