Consumir
cannabis queima os neurônios? Parcialmente verdade. Estudos comprovam que fumar
a droga antes dos 15 anos de idade diminui o QI, mas essas mesmas pesquisas
mostram que, após os 20 anos, a cannabis não traz problemas cognitivos.
"Essa
diferença tem a ver com a maturação do cérebro, porque na adolescência ele ainda
está a terminar de se formar. Entre os 15 e os 20 anos é uma faixa nebulosa,
onde não foi possível comprovar qual o impacto. Ainda assim, consideramos uma
idade de risco", explica Thiago Marques Fidalgo, psiquiatra do Hospital A.
C. Camargo.
Um grupo de
cientistas da Universidade Pompeu Fabra, de Barcelona, em Espanha, afirmou ter
descoberto o mecanismo cerebral que altera a coordenação motora pelo consumo
crônico de cannabis.
O estudo,
que foi publicado nesta segunda-feira na revista Journal of Clinical
Investigation, demonstra que a exposição crônica à principal substância
psicoactiva da cannabis, o delta9-tetrahidrocannabinol (THC), ocasiona uma
inflamação no cerebelo, a área do cérebro que coordena os movimentos e é
responsável pela aprendizagem motora.
Segundo
explicou um dos pesquisadores do projeto, Andrés Ozaita, até agora sabe-se que
o consumo crônico de cannabis causa uma diminuição dos receptores da droga que
estão presentes em quase todas as partes do cérebro e realizam funções
diferentes.
Com esta
nova pesquisa foi possível demonstrar que esta diminuição dos receptores
provoca um "ambiente neuroinflamatório" no cerebelo, já que ativa a
micróglia, um conjunto de células consideradas o sistema imunológico do
cérebro.
A micróglia,
que normalmente está latente, é ativada perante o THC do mesmo modo quando há
um dano cerebral, produzindo uma inflamação que impede o correto funcionamento
do cerebelo.
"O
estudo da Universidade espanhola foi realizado com ratos de laboratório que,
após a exposição à cannabis, manifestaram problemas "leves" de
coordenação motora", segundo explicou Ozaita.
Estes danos
são reversíveis porque a pesquisa demonstrou que quando é interrompido o
consumo de cannabis e são utilizados fármacos inibidores da micróglia, os problemas
de coordenação motora reduzem ou desaparecem completamente.
Segundo os
cientistas, este mecanismo cerebral poderia funcionar igualmente com os humanos
já que foi demonstrado que o consumo crônico elevado de cannabis gera, também,
problemas de coordenação e uma diminuição do número de receptores de cannabis,
de modo que o único que falta demonstrar é que a micróglia é activada também.
O trabalho
de investigação foi elaborado pelos cientistas Laura Cutando, Arnau
Busquets-Garcia, Emma Puighermanal, Maria Gomis-González, José María
Delgado-García, Agnès Gruart, Rafael Maldonado e Andrés Ozaita.